terça-feira, 26 de junho de 2012

Tilopa

A CANÇÃO DE MAHAMUDRA


Mahamudra está para além das palavras e símbolos,

mas para ti, Naropa, sério e leal,

isto deve ser dito:


O Vácuo não precisa de confiança,

Mahamudra repousa sobre nada.

Sem fazer esforço,

mas permanecendo desprendido e natural,

é possível quebrar o jugo,

ganhando, assim, a Libertação.


Se alguém nada vê quando contempla o espaço,

se com a mente alguém observa a mente,

esse alguém destrói distinções

e alcança o estado de Buddha.


As nuvens que vagueiam pelo céu

não têm raízes, nem lar,

também assim são os pensamentos distintivos

vagando através da mente.

Desde que a mente-eu é vista,

cessa a discriminação.


Formas e cores formam-se no espaço,

mas o espaço não é tingido nem pelo branco, nem pelo preto.

Da mente-eu todas as coisas emergem,

e a mente não é manchada nem por virtude, nem por vícios.


As trevas dos tempos

não podem amortalhar o sol fulgente;

os longos kalpas do samsara

jamais podem esconder a luz brilhante da Mente.


Embora palavras sejam ditas para explicar o Vácuo,

o Vácuo, tal como é, jamais pode ser explicado.

Embora digamos que a Mente é uma luz brilhante,

ela está para além de todas as palavras e símbolos.

Embora a Mente seja vazia em sua essência,

contém e abarca todas as coisas.


Nada faças com o corpo, mas relaxa;

fecha com firmeza a boca e permanece silente;

esvazia a mente e em nada penses.

Como um bambu oco, repousa bem teu corpo.

Sem dar nem tomar, repousa tua mente.

Mahamudra é como a mente que a nada se prende.

Assim praticando alcançarás, em tempo, o estado de Buddha.


A prática do mantra e do paramita,

a instrução em sutras e preceitos,

o ensino das escolas e das escrituras,

não levarão à percepção da Verdade Inata.

Porque, se a mente, quando tomada por algum desejo,

procura encontrar um objetivo,

apenas oculta a Luz.


Aquele que observa os preceito tântricos, ainda discrimina,

trai o espírito de samaya.

Cessa toda atividade, abandona todos os desejos,

deixa que os pensamentos subam e desçam,

coisa que eles farão, como ondas no oceano.

Aquele que nunca prejudica o não-perdurável,

nem o princípio da não-distinção,

defende os preceitos tântricos.


O que abandona o desejo insaciável

e não se prende a isto, nem àquilo

percebe o significado real dado nas escrituras.


Em Mahamudra todos os pecados são consumidos;

em Mahamudra está a libertação

dos cárceres desse mundo.

Esse é o supremo archote do Dharma.

Os que não crêem nisso são insensatos,

para sempre chafurdados em sofrimento e tristeza.


Se alguém quer lutar pela libertação,

Precisa confiar num Guru.

Quando a tua mente recebe a bênção dele

A emancipação está próxima.


Ai! Todas as coisas deste mundo são sem sentido,

Não passam de sementes de dor.

Ensinamentos pequenos levam a ações ---

Só se devem seguir os Grandes Ensinamentos.


Transcender a dualidade é visão soberana.

Dominar abstrações é prática régia.

A trilha da não-prática é o caminho de todos os Buddhas.

Quem pisa essa trilha alcança o estado de Buddha.


Transitório é este mundo;

como fantasmas e sonhos, ele não tem substância alguma.

Renuncia a ele, abandona teus parentes,

corta os laços da luxúria e do ódio,

e medita em bosques e montanhas.


Se, sem esforço,

permaneceres desprendidamente em estado natural,

logo Mahamudra conseguirás,

e obterás a não-obtenção.


Corta a raiz das árvores e as folhas murcharão;

corta a raiz da tua mente e samsara tomba.

A luz de qualquer lâmpada dissipa, num momento,

as trevas de longos kalpas;

a luz forte da mente, num simples lampejo,

queimará o véu da ignorância.


Quem quer que se agarre à mente

não vê a verdade que está além da mente.

Quem quer que lute para praticar o Dharma,

não encontra a verdade que está para além da prática,

A fim de saber o que há além da mente e da prática,

é preciso cortar completamente a raiz da mente,

e ficar despido.

Assim, deves afastar-te de todas as distinções

e permanecer tranqüilo.


Não devemos dar nem receber,

mas permanecer natural, porque Mahamudra

está para além de toda aceitação e rejeição.

Já que alaya não é nascida,

ninguém pode obstruí-la ou manchá-la;

conservando-se na região não-nascida

toda aparência se dissolverá em Dharmata

e o egoísmo e o orgulho se desvanecerão em nada.


A suprema compreensão

transcende tudo isto e tudo aquilo.

A suprema ação

contém grande produtividade sem apego.

A suprema realização

é compreender a imanência sem desejo.


De início, o yogui sente que sua mente

se está despencando como uma cascata;

a meio curso, como o Ganga,

ela flui, lenta e suavemente;

ao fim, é um grande, um vasto oceano,

onde as luzes da mãe e do filho fundem-se numa só.

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