segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Aos utopeus

"Louváveis esforços são feitos, sem dúvida, para ajudar a Humanidade a avançar; encorajam-se, estimulam-se, honram-se os bons sentimentos, hoje mais do que em qualquer outra época, e não obstante o verme devorador do egoísmo continua a ser a praga social. É um verdadeiro mal que se espalha por todo o mundo e do qual cada um é mais ou menos vítima. É necessário combatê-lo, portanto, como se combate uma epidemia. Para isso, deve-se proceder à maneira dos médicos: remontar à causa. Que se pesquisem em toda a estrutura da organização social desde a família até os povos, da choupana ao palácio, todas as causas, todas as influências patentes ou ocultas que excitam, entretêm e desenvolvem o sentimento do egoísmo. Uma vez conhecidas as causas o remédio se apresentará por si mesmo; só restará então combatê-las, senão a todas ao mesmo tempo, pelo menos por partes, e pouco a pouco o veneno será extirpado. A cura poderá ser prolongada porque as causas são numerosas, mas não é impossível de resto, não se chegará a esse ponto se não se atacar o mal pela raiz, ou seja, pela educação. Não essa educação que tende a fazer homens instruídos, mas a que tende a fazer homens de bem. A educação, se for bem compreendida, será a chave do progresso geral, quando se conhecer a arte de manejar a arte dos caracteres como se conhece a de manejar as inteligências, poder-se-á endireitá-los, da mesma maneira como se endireitam as plantas novas. Essa arte, porém, requer muito tato, muita experiência e uma profunda observação. É um grave erro acreditar que basta ter a ciência para aplicá-la de maneira proveitosa. Quem quer que observe, desde o instante do seu nascimento, o filho do rico como o do pobre, observando todas as influências perniciosas que agem sobre ele em consequência da fraqueza, da incúria e da ignorância dos que dirigem, e como em geral os meios empregados para moralizar fracassam, não pode admirar-se de encontrar no mundo tantas confusões. Que se faça pela moral tanto quanto se faz pela inteligência e ver-se-á que, se há naturezas refratárias, há também, em maior número do que se pensa, as que requerem apenas boa cultura para darem bons frutos.

"O homem quer ser feliz e esse sentimento está na sua própria natureza; eis porque ele trabalha sem cessar para melhorar a sua situação na Terra, e procura as causas de seus males para os remediar. Quando compreender bem que o egoísmo é uma dessas causas, aquela que engendra o orgulho, a ambição, a cupidez, a inveja, o ódio, o ciume, dos quais a todo momento ele é vítima, que leva a perturbação a todas as relações sociais, provoca as dissensões, destrói a confiança, obrigado-o a se manter constantemente numa atitude de defesa em face do seu vizinho, e que, enfim, do amigo faz um inimigo, então ele compreenderá também que esse vício é incompatível com a sua própria felicidade. Acrescentaremos que é incompatível com a sua própria segurança. Dessa maneira, quanto mais sofrer mais sentirá a necessidade de o combater, como combate a peste, os animais daninhos e todos os outros flagelos. A isso será solicitado pelo seu próprio interesse.

"O egoísmo é a fonte de todos os vícios, como a caridade é a fonte de todas as virtudes. Destruir um e desenvolver a outra deve ser o alvo de todos os esforços do homem, se ele desejar assegurar a sua felicidade neste mundo, tanto quanto no futuro."