domingo, 15 de abril de 2012

Mazelas...

[...] Eu não nasci pra literatura. Tenho que ser falso comigo mesmo para que tenha alguma chance de poder agradar o leitor. Nem sou tão esperto quanto pareço!, pois pareço não conseguir terminar nada do que começo – o que me parece burrice. Meu ar é depressivo; não sei falar da felicidade. Como se falar de algo que nunca vivi? Impossível também me agradar a mim mesmo. Sou um mentiroso... E permaneço preso às mentiras que acabo criando. Sou papéis. Ora um papel eu tomo, ora outro. Sou diferente conforme a pessoa que se encontra comigo. Influenciável... Influente? Não; não ajo como eu ajo quando estou sozinho. Nunca estou sozinho. Quem sou eu? (Um escritor.)

terça-feira, 3 de abril de 2012

Ação e Reação

"- Em verdade, estamos ainda longe de conhecer todo o poder criador e aglutinante encerrado no pensamento puro e simples, e, em razão disso, tudo devemos fazer por libertar os entes humanos de todas as expressões perturbadoras da vida íntima. Tudo o que nos escravize à ignorância e à miséria, à preguiça e ao egoísmo, à crueldade e ao crime é fortalecimento da treva contra a luz e do inferno contra o Céu.

E talvez porque desejasse ardentemente mais alguma anotação, em torno do transcendente assunto, Silas ajuntou:

- Recorda-se de haver lido alguma memória, alusiva às primeiras experiências de Marconi, nos albores do telégrafo sem fio?

- Sim - respondi -, lembro-me de que o sábio, ainda muito jovem, se consagrou ao estudo das observações de Henrique Hertz, o grande engenheiro alemão que realizou importantes experiências sobre as ondulações elétricas, comprovando as teorias da identidade da transmissão entre a eletricidade, a luz e o calor irradiante, e sei que, certa feita, tomando-lhe o oscilador e conjugando-o com a antena de Popoff e com o receptor de Branly, no jardim da casa paterna, conseguiu transmitir sem fio os sinais do alfabeto Morse. Mas... que tem isso a ver com o pensamento?

O Assistente sorriu e falou:

- A referência é significativa para as nossas considerações. Além dela, volvamos à televisão, uma das maravilhas da atualidade terrestre...

E acrescentou:

- Reporto-me ao assunto para lembrar que na radiofonia e na televisão os elétrons que carreiam as modulações da palavra e os elementos da imagem se deslocam no espaço com velocidade igual à da luz, ou seja, a trezentos mil quilômetros por segundo. Ora, num só local podem funcionar um posto de emissão e outro de recepção, compreendendo-se que, num segundo, as palavras e as imagens podem ser irradiadas e captadas, simultaneamente, depois de atravessarem imensos domínios do espaço, em fração infinitesimal de tempo. Imaginemos agora o pensamento, força viva e atuante, cuja velocidade supera a da luz. Emitido por nós, volta inevitavelmente a nós mesmos, compelindo-nos a viver, de maneira espontânea, em sua onda de formas criadoras, que naturalmente se nos fixam no espírito quando alimentadas pelo combustível de nosso desejo ou de nossa atenção. Daí, a necessidade imperiosa de nos situarmos nos ideais mais nobres e nos propósitos mais puros da vida, porque energias atraem energias da mesma natureza, e, quando estacionários na viciação ou na sombra, as forças mentais que exteriorizamos retornam ao nosso espírito, reanimadas e intensificadas pelos
elementos que com elas se harmonizam, engrossando, dessa forma, as grades da prisão em que nos detemos irrefletidamente, convertendo-se-nos a alma num mundo fechado, em que as vozes e os quadros de nossos próprios pensamentos, acrescidos pelas sugestões daqueles que se ajustam ao nosso modo de ser, nos impõem reiteradas alucinações, anulando-nos, de modo temporário, os sentidos sutis.

E, depois de ligeira pausa, concluiu:

- Eis por que, efetuada a supressão do corpo somático, no fenômeno vulgar da morte, a criatura desencarnada, movimentando-se num veículo mais plástico e influenciável, pode permanecer longo tempo sob o cativeiro de suas criações menos construtivas, detendo-se em largas faixas de sofrimento e ilusão com aqueles que lhe vivem os mesmos enganos e pesadelos. A explicação não podia ser mais clara."

André Luiz