Acrópole
– mais uma busca frustrada.
“Tudo
está dentro do homem e é inútil procurar salvação longe de si
mesmo”
A
busca de nosso amigo Ricardo do Vale por alguma coisa que some
conhecimento e sabedoria à sua vida terminou numa noite
completamente estapafúrdia neste sábado passado.
À
tarde, Ricardo foi a uma capela católica que julgava “o lugar do
meu Eu Original” porque nascera no quartel onde fica a capela.
Entre músicas animadinhas e jovens falando pelos cotovelos Ricardo
não ficou um minuto a mais ali – saiu, alegre, escutando Killers
– vou beber.
A Acrópole da
filosofia
15/11/08 Sáb.
Blues 9:04
Simplesmente,
após ir a uma capela católica e me decepcionar comigo mesmo e não
com a igreja e seus pupilos adolescentes que fazem crisma e
secretamente se masturbam até subirem pelas paredes...
Ele
jantou muito bem e saiu, escutando Sepultura. Jamais abandonaria sua
fé. Fora expulso de uma igreja na qual trabalhou ardentemente
durante 10 anos de sua vida. Expulso porque “você não pensa como
nós”. O ótimo foi que Ricardo não trabalhava para as pessoas.
Nem para si. Para quem então? Para a Mãe, ainda que naquela época
a conhecesse pelo nome de Pai.
Andou
na praia. Comprou uma garrafa de vinho Country Wine, personagem
célere de seu primeiro romance, Miriam.
E
começou a beber o delicioso vinho.
...
fui a uma Acrópole – enfim, uma Escola de Filosofia – cursos de
Filosofia e Sabedoria Pura, como estudar, como ler.
Ao
entrar, me deparei com um jardim, mais parecido com os jardins de
Epicuro – fontes, plantas – e estátuas as mais diversas.
Ultrapassados os Umbrais deste Templo do Conhecimento, me deparo com
uma cesta de revistas, panfletos, papéis sobre Sabedoria – tudo
PAGO. Frustrei-me. Esta, a Sabedoria, paga?!
Uma
mulher me recebeu, a Mestra, aparentemente masculinizada ...
Quando
a Lua saiu Ricardo realizou mais um sonho de sua vida – ver a lua
cheia nascer. Nutrira este sonho durante anos a fio, desde que vira a
Lua cheia no final de uma tarde, casualmente.
Enquanto
a Lua nascia, ele se rejubilava – e se entupia de vinho,
julgando-se um mago. E por que não?
“Eu
sou um bruxo, enfim”, pensou. “Um Mago”. Tentara as religiões,
mas nada. Como percebera que estava entrando em mais uma crise de
loucura, tentou amenizar e disse: “Não sou bruxo. Que é um bruxo?
Os wiccanos certamente fazem a mesma coisa que se faz nas igrejas
pelas quais passei: se reúnem para conversar banalidades e fazer
rituais. O que eu sou então? Eu sou.”
“O
Universo é a minha igreja.”
A
estas alturas, a Mestra, as fontes epicuristas, aquele templo feito
de tenda de praia, a piscina com inscrições de Buda e os saquinhos
de chá pareciam elementos distantes de outro mundo.
Foi
quando ele viu o Sinal.
-
Já deu seu e-mail? – disse a mulher masculinizada.
Prudentemente
não dei o e-mail. Observei as revistas cozinha água chás piscina
estátuas filosóficas mangueirinhas e até máscaras – e os
ouvintes, quase todas mulheres loiras, botox, sorrisos artificiais,
buscando algo, uma resposta – que jamais será encontrada e
infinitamente menos num Curso de Filosofia Prática onde o lema
interessantíssimo é: HOUVE UM TEMPO EM QUE A FILOSOFIA ERA
PRÁTICA... ESSE TEMPO VOLTOU.
A
submestra nos homenageou com 4 ininterruptas poesias falando da
Beleza.Eu tenho absoluta certeza de que as pessoas que vivem falando
de beleza em poesia são completamente frustradas porque gostariam de
namorar alguém a quem nunca dirigiram uma palavra. Pode ser um
julgamento, mas julgo primeiro a mim porque eu vivi 15 anos neste
estado patético.
A
entonação da submestra, seu Desejo, era tão premente que algumas
das mulheres presentes sorriam, ainda que de forma patética ou
mesmo incitada pelo Prozac.
Uma
coruja branca parou diante de Ricardo e ficou estática no ar. Havia
então a Lua, que a estas alturas estava bela, e a coruja. Era o
Sinal.
Um
sinal é uma coincidência. É apenas outro nome para coincidência;
neste caso, um nome espiritualizado. Se tudo é Acaso, louvemos a
este Deus – o Acaso – que é capaz de fazer uma coruja parar na
frente de um ser humano (bêbado) e (corta).
Ele
andou, foi pro blues e sentou numa mesa para escrever. Após escrever
algo sobre a palhaçada na Escola de Sabedoria, continuou:
A Mestra entrou. Seu sorriso era benzodiazepínico, seu cabelo, preto, e sua roupa baixoautoestímica. Ela entrou – após a sessão inesgotável de poesias das Musas Gregas evocando deusas que não existem no entanto na mente de um(a) filósofo(a) existem – e deu a sentença.
-
Falaremos sobre Buda.
Ela
tinha cara de quem estava pensando em QUALQUER coisa – sei lá, na
filha que saiu e gritou, no marido inorgástico, na péssima imagem
de seu templo filosófico – MENOS EM BUDA. Seu interesse era zero.
A
Mestra, que na verdade era Psicóloga, discorreu de forma resumida a
história de Gautama – uma história que as pessoas adoram ler,
falar, comentar, dissecar com seus palavrórios inúteis, MENOS
PRATICAR. Falou, adaptou, disse que tirássemos lições para nós –
em outras palavras, não precisa levar isso a sério demais,
aproveite alguma coisa pra não pirar e para sair da depressão
matinal –“sem levar a sério demais”.
Eu
levantei e fui embora comprar uma garrafa de vinho.
Andou,
foi pro blues, bebeu uma Heineken, jogou xadrez com um rapaz de 19
anos absolutamente educado, gentil e nobre. O rapaz, vendo que
Ricardo fora “humilhado pelo meu professor de xadrez quando eu
tinha 15 anos e” (melodrama inconsciente) passou gentilmente a
ensinar-lhe algumas jogadas e depois chamou-o para junto de seus
amigos para jogar sinuca. Ricardo não foi. Foi para o balcão.
Segundo sua sabedoria deliróide, ficar no balcão era símbolo de
que “Ele vai ver que não estou na cola dele”. Comentários à
parte, Ricardo encheu a cara e com a maior naturalidade deu um papel
com nome telefone e msn ao rapaz, que recebeu gentilmente. Ainda
existem cavalheiros neste mundo enfim.
-
Eu vou me suicidar!!! – disse Ricardo a Cronos. A estas alturas ele
estava absolutamente bêbado.
Cronos
ficou preocupado, até por causa do “histórico” de Ricardo com
problemas pessoais, mas sorriu, pois sabia exatamente o que estava
acontecendo – Ricardo estava sendo ele mesmo. Já não era o
“mestre” que dá lições a todo mundo, sentando de forma bipolar
no meio de uma pista movimentada ou lendo livros depressivos no
inverno. Era o Ricardo original, cheio de dúvidas, medos e
conflitos; um ser humano!
Ricardo
nunca quis ser mestre de ninguém. Nem seguir mestre algum. Mas, no
fundo de seu ser, queria ensinar aos integrantes do Nya a seguinte
lição: o que você sabe, pratique, senão seu conhecimento se
voltará contra você e o dilacerará.
Enchera
o saco. Vira na igreja, durante anos a fio, os pastores pregando
coisas que nem eles nem os outros vivem. Passara então a viver uma
vida de risco, dando até seu MSN a um rapaz que sequer conhece. Mas
ele tem uma capacidade incrível de ver a aura dos outros.
“Ninguém
sabe quem é ninguém”.
Mentira.
Conhecemos
as pessoas pelo que falam, comem, bebem, pelos lugares que
freqüentam, e principalmente pela forma como tratam os pais.
As
mentiras religiosas dilaceraram Ricardo a ponto de ele entrar num
colapso nervoso. Ele não entendia como poderia vir a ser puro e,
neste transtorno bipolar espiritual, oscilava do libertino ao santo
tantas vezes que a coisa já virara uma piada barata.
Retornara
ao catolicismo, cristais, magia, budismo, enfim, nada o satisfazia.
Porque
ele já estava satisfeito.
Mas
você tem que ter mais. A ambição espiritual de Ricardo nunca foi
pelo Poder. Teve três experiências sobrenaturais, que serão
relatadas na hora certa. Mas ele só queria o Dom Supremo. O Amor. E
queria externar este amor na igreja. Externou. E foi excomungado.
Porque
é melhor gritar, odiar e comer vivo o outro. Mas amar é pecado,
sujeira.
-
Eu vou me suicidar!!!
Cronos
deu-lhe água, ele nem sabia o que estava fazendo, e vomitou. Após
vomitar, deu um belo discurso, bem coerente até, e foi aos trancos
para casa – não sabe sequer como caiu na cama.
XXXIII
DOM. COMUM (Cor Verde, I semana do saltério)
Ricardo do Vale